Meeting Denis Muniz
quarta-feira, 23 de setembro de 2015
Me: "Denis, this
is a good opportunity to tell you that it was a pleasure for Joel and me to
meet you and Bete. We like you both very much.”.
Denis: "It
was kind of you to tell me this.I mean that there are no people like you who
are so frank. Bete and I have sensed the same thing about you."
Me: "It's hard to have an understanding like that between two
couples. Generally, I like only one of two people, but I don't like both of
them, or I like people that Joel doesn't like or vice versa.”.
Denis: "The
same thing happens with us!”.
O fruto da figueira velha
quinta-feira, 13 de agosto de 2015
Denise
não acreditava em casa mal-assombrada. Não há nada que dez baldes de tinta
fresca não resolvam, costumava dizer. Além disso, ficou louca quando viu o
casarão à venda. Era simplesmente espetacular. Tinha um excelente terreno para
fazer jardim e quintal, três salas imensas, cinco quartos, três banheiros e
vários cômodos que poderiam ser adaptados. O lugar perfeito para uma
recém-casada que pretendia ter muitos filhos.
Velha
era, até demais. Exigiria um bocado de reformas. Mas o preço era incrivelmente
baixo. Jamais conseguiria comprar uma casa daquelas tão barato.
Não
foi difícil convencer o noivo a trocar o sonho de um pequeno apartamento de
sala e quarto por uma mansão maravilhosa. Compraram o imóvel e levaram um ano
inteiro fazendo obras. Ao fim do período, tinham uma casa simplesmente deslumbrante.
A antiga fachada descascada agora exibia uma alegre pintura amarela. Portas,
janelas e pisos tinham sido recuperados. Cômodos que antes cheiravam a mofo
deixavam passar fartas lufadas de ar fresco. Canteiros de flores e ervas aromáticas
substituíam o terreno baldio que antes rodeava a casa. Tinham capinado e
replantado tudo.
Denise
só manteve uma antiga figueira. Era simplesmente magnífica com seu tronco forte
e uma profusão de galhos. Quem chegasse à casa, veria, em primeiro lugar, a
figueira, que reinava, soberana, na entrada. Em seguida, prestaria atenção à
moradia impecavelmente reformada.
Agora,
ali, tudo era claro, colorido e cheirava bem.
Verdade
que a vizinhança ainda evitava o lugar. Até mesmo o carteiro relutava em se
aproximar. Mas nada impediu o jovem casal de mudar-se para lá logo após a
lua-de-mel.
Denise
ainda se lembrava bem do dia da mudança, os dois pegando carona no caminhão e
olhando as ruas com uma curiosidade infantil. Foi nessa ocasião que ela reparou
na igrejinha que ficava a poucos quarteirões da casa. Uma graça.
Apesar
de sua arquitetura antiguinha, era obviamente nova, com a pintura ainda fresca
e um sino que ainda reluzia.
Denise
e Tiago capricharam na primeira noite que passaram na nova residência. Montaram
uma bela mesa no jardim e serviram ali um jantar especial, com toalhas
bordadas, talheres novos, flores e velas.
Apaixonado,
o casal tomou uma taça de champanhe, enquanto admirava a propriedade e engolia
a comida feita por eles mesmos — que nem estava tão boa assim, mas nem ligaram.
Nenhum
dos dois era bom cozinheiro. O romantismo foi o suficiente para ignorarem o bife
duro e o arroz mal cozido. Mas, na hora da sobremesa, foi impossível engolir o
pudim. Feito com todo o amor do mundo — mas nenhuma técnica culinária —, foi deixado
de lado logo depois da primeira colherada. Estava intragável.
O
jeito era rir do desastre. Rir muito, jogando a cabeça para trás, olhando a lua
e dando muitos beijos.
Foi
assim, com a cabeça jogada para trás e plena de felicidade, que Denise percebeu
que a figueira estava repleta de frutos. À luz do luar, os figos brilhavam,
cintilantes e convidativos.
Nem
pestanejou. Correu para a árvore e colheu o mais bonito. Seria a sobremesa
certa para aquela noite perfeita — só estragada por um errinho de nada na
receita do pudim. Voltou para a mesa rindo e mordendo a fruta. Estava
deliciosa. Madura, carnuda e doce como a melhor das sobremesas. Comeu uma metade, deu a outra ao marido, e foram
dormir.
Nada
explicaria o terrível pesadelo daquela noite. A brisa estava fresca, o quarto
arejado, os lençóis eram novos e macios, o jantar tinha sido leve e ela estava
muito feliz. Tratava-se de uma realidade tão perfeita que era consigo mesma que
Denise sonhava. Sonhava que estava dormindo em sua casa nova, ao lado de seu marido,
depois de um alegre jantar no jardim.
No
sonho, experimentava passar o peito do pé de leve sobre o lençol. Ia sentindo a
maciez do tecido como um carinho até que seu pé tocasse o corpo de Tiago.
Então, voltava para a posição inicial e começava tudo de novo. Deslizar a pele
pelo algodão fresco, tocar a perna do marido, recolher o pé.
No
entanto, num desses movimentos, esbarrou numa coisa diferente. Em vez da
suavidade do tecido ou do calor do corpo de Tiago, seu pé tocou numa superfície
áspera e úmida, como um osso recoberto por escamas geladas. Abriu os olhos, sobressaltada,
e viu uma criatura sentada em sua cama, entre ela e o marido.
Não
dava para saber ao certo do que se tratava, se bicho ou assombração. O corpo,
muito magro, era recoberto de couro rugoso. A coisa eslava sentada de cócoras,
com os joelhos dobrados, mas não da maneira como uma pessoa encolhe as pernas.
E os pés e mãos, mais parecidos com garras, lhe diziam que aquilo,
decididamente, não era humano.
Nem
precisaria dizer, bastava olhar o rosto. A cabeça pendia do pescoço e girava em
todas as direções como a de uma galinha. Mas os olhos estavam cravados nela.
Miúdos, brilhantes, tão estúpidos quanto cruéis.
Embora
a coisa não a tocasse com as mãos, Denise sentia a garganta comprimida de tal
modo que não conseguia gritar.
Tampouco
podia mover o corpo. Muda e paralisada, viu quando a criatura abriu a boca —
seria aquilo um sorriso? — e lhe disse:
—
Gostaria de saber quem a autorizou a roubar minhas frutas.
Denise
queria se defender. Não tinha roubado nada. A casa era sua. Mas a voz não saía.
A criatura, no entanto, pareceu ler seus pensamentos.
—
A casa é sua? — Uma risada debochada ecoou pelo quarto. — Quem lhe contou um
absurdo desses? Esta casa me pertence. Ela e tudo o que está dentro dela.
Antes
que Denise pudesse retrucar, o estranho ser pulou para o chão e completou,
sibilando:
—
Inclusive você.
Dizem
que quando uma pessoa morre vê toda a sua vida passar diante dos olhos numa fração
de segundo. Coisa parecida aconteceu com Denise. De repente, tudo o que já
tinha ouvido falar a respeito de fenômenos sobrenaturais passou por sua mente ao
mesmo tempo. Informações às quais jamais dera a menor importância. Histórias
que sempre julgara pertencerem ao folclore e às crendices populares.
Subitamente, tudo fazia sentido, tudo parecia totalmente real.
Figueiras
são as casas do diabo, sempre lhe dizia sua avó. O tinhoso escolhe essas
árvores como moradia porque elas foram amaldiçoadas por Jesus.
Denise
nunca dera muito crédito às histórias da avó. Tivesse prestado atenção nelas,
teria desconfiado do casarão tão barato,
do pavor que a vizinhança manifestava do local. Mas nunca tinha sido
supersticiosa.
—
Superstição? — debochou o diabo, lendo seus pensamentos. — Ora, minha querida,
você é minha propriedade e está em meus domínios. E roubou uma fruta da minha
árvore. Vai ter que devolvê-la.
Sentada
na cama, quase sufocando de pavor, Denise não conseguia responder, nem se
mover, nem sequer respirar direito.
Quando
o grito se soltou de sua garganta, Tiago deu um pulo. Já era manhã alta.
Sentada na cama, Denise uivava como um bicho selvagem, na mesma posição em que
estivera enquanto o demônio lhe falava as coisas horríveis que escutara. Teria
dormido daquele jeito? Sentada? Não era possível. A impressão era de que fora tirada
dali, inconsciente, e acabara de ser devolvida a seu quarto.
Tiago
tentava acalmá-la. Dizia mil vezes que tudo não passara de um pesadelo. Mas
nada adiantava. Denise ainda sentia inteiro o horror da presença, como se a
besta apenas tivesse se tornado invisível, mas continuasse ali.
Desde
essa noite, não conseguiu mais dormir direito. Mal anoitecia, seu coração
ficava pesado, cheio de pressentimentos. O sono era interrompido a toda hora
por sustos que a faziam abrir os olhos na escuridão. Não via nada diferente no
quarto, mas tinha certeza de que o demônio estava ali, com seus olhos estúpidos
e cruéis fixados nela.
E
foi assim, noite após noite. Denise emagreceu, ganhou olheiras profundas, tornou-se
frágil e nervosa. Nada lembrava a jovem apaixonada e cheia de vida que se
casara tão pouco tempo atrás.
Dois
meses mais tarde, teve uma notícia. Estava grávida. Em vez de ficar feliz, como
era de se esperar, caiu no choro. Não sabia por que, mas tudo o que aquela
gravidez lhe dava era um medo imenso. Como para confirmar seus piores
presságios, naquela noite, o bicho medonho voltou.
Estava
quase adormecendo quando sentiu que garras ásperas e frias tocavam seu rosto.
Mesmo sem abrir os olhos, sabia quem estava a seu lado. Podia sentir seu hálito
metálico e ouvir seus passos cambaleantes.
—
Não adianta fingir que está dormindo. Sei que você me escuta — disse a coisa,
com sua voz falsamente meiga.
Não
era faz-de-conta. Denise não conseguia se mexer, nem falar, nem gritar. E foi
assim, paralisada, que escutou a voz do demônio pela última vez.
—
Não quero perturbá-la demais, minha menina — começou ele, pigarreando. —
Mulheres grávidas devem ser deixadas em paz. A última coisa que eu desejaria
era que esse doce fruto que você carrega no ventre azedasse por conta de seu
nervosismo.
O
peçonhento pulou para o chão, e continuou falando enquanto andava de um lado para
outro, balançando a cabeça, mas sem jamais tirar os olhos de sua presa.
—
Mas, pense bem, minha linda. Agora, você terá uma chance de ouro de pagar a
dívida que tem comigo. Você ficou com meu fruto. Eu fico com o seu. Tudo muito
justo. Basta que você me entregue a criança e prometo não voltar a perturbar
seu sono.
Mesmo
impossibilitada de mover-se ou gritar, Denise agitou-se de tal maneira que seu
interlocutor começou a rir.
—
Ora, ora, não entendo por que tamanha indignação. Estou lhe propondo um
pagamento absolutamente justo pelo roubo que você cometeu. E, na verdade, não é
bem uma proposta. Estou apenas lhe dando
a chance de comportar-se com dignidade e de corrigir seu erro. Se você não me
entregar essa criança por bem, farei exatamente o que você fez comigo:
invadirei seus domínios e a tirarei de você como quem arranca uma fruta do
galho.
Dado
o recado, o demônio desapareceu. E cumpriu sua promessa. Não apareceu mais nos
meses seguintes.
A
ausência do tinhoso não acalmou Denise. Quanto mais se aproximava a data do
parto, mais tudo lhe parecia um pesadelo real.
Um
dia, Tiago passava pela rua, preocupado com o estado daesposa, quando viu a
igrejinha. Era a mesma que tinham avistado no dia da mudança. Estava aberta. Da
rua, era possível perceber que não havia ninguém ali dentro. Assim mesmo, resolveu
entrar e rezar um pouco.
O
interior da pequena igreja era mal iluminado. Mal dava para perceber direito os
detalhes da construção. Mas era evidentemente nova ou tinha sido
recém-reformada porque, em vez do aroma adocicado de incenso que costuma
impregnar as igrejas, ali o que predominava era cheiro de tinta fresca.
Tiago
aproximou-se do altar, ajoelhou-se e, antes mesmo de fazer o sinal-da-cruz e
começar a rezar, viu que um homem se aproximava. Era o padre. Parecia bastante
jovem.
—
Posso ajudá-lo? — perguntou o pároco. Sua voz era suave e inspirava confiança.
O
rosto de Tiago iluminou-se. Sim, se havia alguém que podia ajudar naquela
situação era um padre. Contou-lhe tudo o que acontecera, sem omitir nenhum
detalhe. Por fim, foi tranquilizado pelo jovem religioso.
—
Meu filho, não se preocupe com mais nada. Agora, esse assunto está em minhas
mãos. Hoje à noite, farei uma visita a sua esposa e conversarei com ela.
À
noite, conforme o prometido, o pároco lhes fez uma visita. Novamente, ouviu
toda a história, agora contada por Denise. E repetiu as mesmas palavras que já
tinha dito a Tiago:
—
Não se preocupe mais com isso, minha filha. O poder que eu represento é muito
forte. Ninguém roubará aquilo que só pertence a meu senhor. Assim que a criança
nascer, virei buscá-la. Ela ficará comigo na igreja. Lá, ela estará a salvo.
Embora
jovem, o padre transmitia imensa segurança e fé. A voz era puro conforto; os olhos,
só doçura. Denise sentiu imediatamente que podia confiar nele. A partir daquele
dia, não teve medo de mais nada. O demônio não perturbava mais seu sono, ela se
alimentava bem e chegava até mesmo a cantarolar enquanto comprava as roupinhas
para o bebê e decorava seu quarto.
Ao
fim do nono mês, teve seu filho, um menino forte e saudável. Nem chegou a levá-lo
para casa. Embrulhou-o numa manta de lã azul-clarinha, como o céu, e saiu
diretamente do hospital para a igreja, onde o padre já a esperava.
—
O senhor acha que ele vai precisar ficar muito tempo aqui? — perguntou, aflita
por ter que se separar do bebezinho.
—
Não, minha filha. Basta que ele durma aqui esta noite.
Amanhã
cedo, iremos batizá-lo. Depois disso, já estará consagrado e intruso nenhum
conseguirá aproximar-se dele.
Aliviada,
Denise deu um beijo na testa do menino e foi para casa, seguida de Tiago.
Na
manhã seguinte, bem cedo, foram para a igreja, acompanhados dos padrinhos.
Denise estava ansiosa, mas feliz. Tiago torcia para que o pesadelo tivesse logo
um fim. Já estavam decididos a mudar de casa e começar vida nova bem longe
dali.
Era
esse o assunto dentro do carro, onde os dois casais riam para tentar disfarçar
a tensão. Denise já estava até pensando que talvez pudessem se mudar para outra
casa antiga.
—
Desde que tenha uma boa igreja por perto — completava o padrinho, que nunca
tinha levado aquela história de figueira muito a sério.
—
A verdade é que sempre ficamos impressionados demais com as forças do mal —
dizia a madrinha. — Acho que o maior poder que elas têm vem do nosso próprio
medo. Quando decidimos enfrentá-las, não resistem.
—
Bem, talvez não seja bem assim — ponderou Tiago, que ainda guardava bem vivos
os gritos apavorados da mulher nas piores noites.
Mas
o padrinho interveio:
—
Ora, Tiago, se não fosse assim, o tal demônio teria aparecido nesta noite mesmo
para buscar a criança. Ele apareceu?
Denise
admitiu que não. Nada lhe perturbara o sono.
—
Pois então — teimou o padrinho. — Vocês ficaram impressionados demais com essa
história.
A
conversa seguia tão animada que o grupo chegou ao fim da rua sem ter parado na
porta da igreja.
—
Passamos do ponto — disse Tiago, ainda rindo. — Vamos ter que voltar.
Fizeram
a manobra no carro e retornaram, desta vez prestando atenção. Mas não viram
igreja nenhuma.
—
Tem certeza de que é aqui? — perguntou a madrinha.
—
Claro! — respondeu Tiago, já apreensivo.
Passaram
novamente pela rua toda. Não havia sinal de igreja por ali.
Toda
a tranquilidade de Denise tinha desaparecido. Sem dar ouvidos às ponderações
dos padrinhos, saltou do carro e começou a correr a calçada de cima para baixo
como uma louca.
Finalmente
parou, com os olhos arregalados, fixos num ponto de um terreno baldio. Todos a
seguiram.
No
centro do terreno, imaculadamente limpo, só havia uma pequena planta. Uma muda
de figueira com cerca de cinquenta centímetros de altura.
Ao
lado da muda, um fiapo de lã azul misturado com a terra denunciava que alguma
coisa tinha sido enterrada ali.
Rosa Amanda Strausz
Sete ossos e uma maldição
Rio de Janeiro: Rocco,
2006. — (Contos de terror para jovens)
Coração conta diferente
sexta-feira, 10 de julho de 2015
- Ai...
- O que é que você tem, Tiago?
Quem falou ai fui eu. Quem me perguntou o que é que eu tinha foi o Renato, que
fica sentado do meu lado e pode vigiar tudo o que eu faço. Ele deve ter pensado
que alguma coisa estava doendo. Mas esse ai
não era de dor.
Então suspirei de novo, mas
agora sem falar nada. Esse suspiro saiu como um sopro, que balançou as folhas
do meu caderno. E pra dentro, baixinho, pra ninguém escutar, eu gemi: Ai, Adriana...
É que ela levantou pra ir ao
quadro. Logo hoje, que ela soltou o cabelo comprido daquele rabo-de-cavalo que
ela costuma usar e me dá tanta implicância. O cabelo dela é tão lindo...Parece
de seda e tem um brilho que eu ia dizer que parece o sol. Mas a Adriana tem
cabelos pretos e sol moreno fica meio esquisito...
7 X 5 = 45...O Renato começou a
rir e cochichou comigo:
- Essa menina é meio lelé.
Eu não ri e nem falei nada. Mas
uma coisa, lá dentro da minha cabeça me disse que 7X5= 35. Como foi a Adriana
que tinha escrito no quadro, eu não percebi o erro. Aquele 4 que ela desenhou
tão certinho no lugar do 3 era tão bonito! Até os números da Adriana são
lindos!
- Tá errado, tia! Tá errado! –
gritou, toda esganiçada, a Carina.
A tia então mandou a Adriana
sentar. A Carina correu e meteu o apagador em cima daqueles números tão bem
desenhados, corrigindo com um 35 tão sem graça quanto sua voz.
A Adriana voltou pro lugar e eu
nem pude ver se ela estava com a cara muito vermelha, porque o cabelo solto
agora tapava tudo. Ela ficou com cabeça abaixada um tempão. Eu senti que ela
estava triste e fiquei muito triste também. Aí, arranquei a beiradinha da
última página do meu caderno e escrevi:
Dobrei meu bilhete. Prestei
atenção à tia. Ela ficou de costas pra passar outra conta no quadro. Fiz bem
depressa uma bolinha com o bilhete dobrado, mirei e joguei. Ela caiu no colo de
Adriana.
Meu coração bateu depressa.
Acho que eu é que fiquei vermelho... Ai,
ai, ai, meu coração martelando tantos ais
no peito. Tudo em silêncio pro Renato não perceber. Que bom que nem ele nem
a Carina viram eu jogar a bolinha!
A Adriana custou a pegar o
bilhete. Pôs a na frente dela e foi desamassando bem devagar. Ela leu, depois
guardou dentro do estojo. Nem olhou pro meu lado.
De repente, me lembrei de uma
coisa terrível: não tinha posto meu nome no papel. E se ela achasse que era
outro menino que gostava dela? E se ela também gostasse de outro menino e, por
causa do bilhete sem nome, fosse falar com ele no recreio?
Então,
a tia me chamou. Eu só pensava naquela confusão, imaginando a Adriana
apaixonada pelo Renato e os dois indo embora, de mãos dadas, no fim da aula.
-
Tá errado! Tá errado! Deixa eu fazer, tia?
Eu
olhei para o quadro e entendi por que é que a Carina estava gritando outra vez:
8x6=36... Ia apagar pra refazer, mas a tia me mandou sentar.
Fui,
morrendo de sem graça. O Renato me gozando só com o jeito de olhar pra mim.
Cheguei
na minha carteira e vi uma bolinha de papel bem em cima do meu caderno.
Quando
ninguém estava mais me olhando, eu disfarcei e abri:
Lino de Albergaria
Coração conta diferente
Editora Scipione, São Paulo
PS: Esse era um dos textos que eu mais adorava ler no ano 2000. Eu
estava na terceira série e tinha uma amiga chamada Carol, que era muito
parecida com a personagem Adriana. Uma vez, eu falei isso pra ela, mas ela nem tchum.
Amnésia Dissociativa: Mãe de 21 anos de idade
sexta-feira, 19 de junho de 2015
Uma jovem casada de 21 anos,
extrovertida, amiga de flertar e algo imatura, mãe de um bebê, ao despertar de
uma apendicectomia, experimentou uma completa amnésia dos cinco anos prévios.
Aos 16 anos de idade, estivera brevemente inconsciente, após um acidente de
automóvel, e acreditava estar hospitalizada por causa desse acidente. Levada
para casa alguns dias depois da apendicectomia, não reconheceu o marido nem o
filhinho. Quando lhe disseram quem eram,
não contestou as suas identidades e limitou-se a dizer que eram
"simpáticos". Durante a convalescença, gostava muito de ler revistas
para adolescentes. A amnésia e a regressão de cinco anos foram reações a uma
situação imediata de tensão: o seu marido estava prestes a formar-se e a ocupar
um cargo na firma da família em sua cidade natal. Ela não queria deixar seu
círculo de amizades e temia viver sob os olhares vigilantes da sogra, uma
mulher muito dominante e severa. Pouco antes da intervenção cirúrgica, a sogra
viera ficar com a família da paciente, ajudando-a a aprontar as coisas para a
mudança. Criticara abertamente os hábitos de dona-de-casa da nora e a maneira
juvenil como se vestia. O episódio amnésico eliminou psicologicamente a
existência da sogra, pois se a paciente nunca tivesse casado não haveria sogra.
Tampouco haveria responsabilidades conjugais, nem um bebê de quem cuidar, ou
necessidade de abandonar os amigos; pelo contrário, poderia viver a existência
de uma adolescente, que correspondia à estrutura da sua personalidade. Contudo,
a amnésia dissipou-se rapidamente com um tratamento hipnótico, depois da
administração de Sódio Amital (Rosen e Gregory, 1965, pág. 241).
Assinar:
Postagens (Atom)